sexta-feira, 14 de dezembro de 2012
quinta-feira, 31 de maio de 2012

"Intimidade é quando a vida da gente relaxa diante de outra vida e respira macio. Não há porque se defender de coisa alguma nem porque se esforçar para o que quer que seja. O coração pode espalhar os seus brinquedos. Cantar a música que cada instante compõe. Bordar cada encontro com as linhas do seu próprio novelo. Contar as paisagens que vê enquanto cria o caminho. Andar descalço, sem medo de ferir os pés."
Ana Jácomo
quarta-feira, 30 de maio de 2012
quinta-feira, 10 de maio de 2012

O peso da vida!
Gostava de senti-lo à tua maneira
e ouvi-la crescer dentro de mim,
em carne viva,
não queria somente
rasgar-te a ferida,
não queria apenas esta vocação paciente
do lavrador,
mas, também, a da terra
e que é a tua
"Assume o amor como um ofício
onde tens que te esmerar,
repete-o até à perfeição,
repete-o quantas vezes for preciso
até dentro dele tudo durar
e ter sentido
Deixa nele crescer o sol
até tarde,
deixa-o ser a asa da imaginação,
a casa da concórdia,
só nunca deixes que sobre
para não ser memória."
Eduardo White
segunda-feira, 30 de abril de 2012
labirintos

"há labirintos que são uma renda
na qual os olhos se emaranham
e as mãos trabalham cuidadosas,
construindo detalhes
em voltas quase imperceptíveis
que cobrem e descobrem
e desenham desenhos impossíveis:
os mais belos.
nestes labirintos eu me perderia
com a alma leve
e o corpo a cantar
num ritmo de blues.
como se tecesse cada dia.
como se tecesse a minúcia,
a curva,
o fio tênue;
entremeadas as palavras
e os passos.
fôlego breve,
grito semi surdo,
olhos voltados para o encantamento.
vida a correr nas veias."
Silvia Chueire
sexta-feira, 27 de abril de 2012
domingo, 22 de abril de 2012
lembrança alada
"Em alguma vida fui ave.
Guardo memória
de paisagens espraiadas
e de escarpas em voo rasante.
E sinto em meus pés
o consolo de um pouso soberano
na mais alta copa da floresta.
Liga-me à terra
uma nuvem e seu desleixo de brancura.
Vivo a golpes
com coração de asa
e tombo como um relâmpago
faminto de terra."
Mia Couto
terça-feira, 17 de abril de 2012
procurar o que?

"O que a gente procura muito e sempre não é isto nem aquilo.
É outra coisa.
Se me perguntam que coisa é essa, não respondo, porque não é da conta de ninguém o que estou procurando.
Mesmo que quisesse responder, eu não podia.
Não sei o que procuro.
Deve ser por isso mesmo que procuro.
Me chamam de bobo porque vivo olhando aqui e ali, nos ninhos, nos caramujos, nas panelas, nas folhas de bananeiras, nas gretas do muro, nos espaços vazios.
Até agora não encontrei nada.
Ou encontrei coisas que não eram a coisa procurada sem saber, e desejada.
Meu irmão diz que não tenho mesmo jeito, porque não sinto o prazer dos outros na água do açude, na comida, na manga e procuro inventar um prazer que ninguém sentiu ainda.
Ele tem experiência de mato e de cidade, sabe explorar os mundos, as horas.
Eu tropeço no possível e não desisto de fazer a descoberta do que tem dentro da casca do impossível.
Um dia descubro.
Vai ser fácil, existente, de pegar na mão e sentir.
Não sei o que é.
Não imagino forma, cor, tamanho.
Nesse dia vou rir de todos.
Ou não.
A coisa que me espera, não poderei mostrar a ninguém.
Há de ser invisível para todo mundo, menos para mim, que de tanto procurar fiquei com merecimento de achar e direito de esconder."
Carlos Drummond de Andrade
domingo, 15 de abril de 2012

"Vivam, apenas.
Sejam bons como o sol.
Livres como o vento.
Naturais como as fontes.
Imitem as árvores dos caminhos
que dão flores e frutos
sem complicações.
Mas não queiram convencer os cardos
a transformar os espinhos
em rosas e canções.
E principalmente não pensem na Morte.
Não sofram por causa dos cadáveres
que só são belos
quando se desenham na terra em flores.
Vivam, apenas.
A Morte é para os mortos!"
José Gomes Ferreira
sábado, 14 de abril de 2012
sábado, 7 de abril de 2012
Queria que este poema fosse para ti...

"Queria que este poema fosse para ti.
Mesmo que não o ouvisses,
Mesmo que não pudesses lê-lo,
Mesmo que a escuridão e o medo te fizessem esquecer quem sou.
Queria que este poema fosse para ti.
Mesmo que as palavras estivessem gastas e que os gestos se cansassem de sorrir,
Mesmo que fizesse frio e a solidão te gelasse os sentidos.
Queria que este poema fosse para ti.
Mesmo que eu já não estivesse.
Mesmo que te escrevesse de qualquer outro lugar. Mesmo que te sorrisse. Mesmo que te amasse sem nunca te poder amar."
Isa Mestre
domingo, 1 de abril de 2012
sábado, 31 de março de 2012
sobre o lado esquerdo

"De vez em quando a insónia vibra com a nitidez dos sinos, dos cristais. E então, das duas uma: partem-se ou não se partem as cordas tensas da sua harpa insuportável.
No segundo caso, o homem que não dorme pensa: "O melhor é voltar-me para o lado esquerdo e assim, deslocando todo o peso do sangue sobre a metade mais gasta do meu corpo, esmagar o coração".
Carlos de Oliveira
Sem Regresso

"Partir.
Abandonar-me.
Abandonar-te.
Foi isto que pensei antes do último beijo,
Do último toque suave,
Da última gota do teu perfume a invadir-me as narinas.
Deixar de ser eu para poder deixar de ser tua.
Estou confusa. Apetece-me cair,
Apetece-me dormir até que chova,
Até que a água arremesse esta solidão que guardaste para me oferecer no último dia.
Estavas ainda a dormir.
Saí sem dizer adeus,
Saí sem saber se voltava,
Sai sem saber se poderia dizer-te que sou incapaz de voltar.
Sei que me amas,
Sei que me amarás mesmo quando não estiver,
Sei que não sou aquilo que escolheste
E isso basta-me para partir.
Não tenhas medo.
Afinal, queria apenas poder amar por instantes,
E isso nunca um outro alguém poderia fazê-lo de forma tão perfeita."
Isa Mestre
terça-feira, 27 de março de 2012
quarta-feira, 21 de março de 2012
ver claro
terça-feira, 20 de março de 2012
armado de amor

"Volto armado de amor
para trabalhar cantando
na construção da manhã.
Reparto a minha esperança
e canto a clara certeza
da vida nova que vem.
Um dia, a cordilheira em fogo,
quase calaram para sempre
o meu coração de companheiro.
Mas, atravessei o incêndio
e continuo a cantar.
Ganhei, sofrendo,
a certeza de que o mundo não é só meu.
Mais que viver,
o que importa é trabalhar na mudança
(antes que a vida apodreça)
do que é preciso mudar.
Cada um na sua vez,
cada qual no seu lugar."
Thiago de Mello
segunda-feira, 19 de março de 2012
sábado, 17 de março de 2012

"Se não falas, vou encher o meu coração
Com o teu silêncio, e aguentá-lo.
Ficarei quieto, esperando, como a noite
Em sua vigília estrelada,
Com a cabeça pacientemente inclinada.
A manhã certamente virá,
A escuridão se dissipará, e a tua voz
Se derramará em torrentes douradas por todo o céu.
Então as tuas palavras voarão
Em canções de cada ninho dos meus pássaros,
E as tuas melodias brotarão
Em flores por todos os recantos da minha floresta."
Rabindranath Tagore
quinta-feira, 15 de março de 2012
quarta-feira, 14 de março de 2012

"Naquela nuvem, naquela,
mando-te meu pensamento:
que Deus se ocupe do vento.
Os sonhos foram sonhados,
e o padecimento aceito.
E onde estás, Amor-Perfeito?
Imensos jardins da insônia,
de um olhar de despedida
deram flor por toda a vida.
Ai de mim que sobrevivo
sem o coração no peito.
E onde estás, Amor-Perfeito?
Longe, longe, atrás do oceano
que nos meus olhos se aleita,
entre pálpebras de areia...
Longe, longe... Deus te guarde
sobre o seu lado direito,
como eu te guardava do outro,
noite e dia, Amor-Perfeito."
Cecília Meireles - Poema do Amor Perfeito

"De repente, intrometem-se uns nacos de sonhos; Uma
remembrança de mil novecentos e onze;
Um rosto de moça cuspido no capim de borco; Um
cheiro de magnólias secas. O poeta procura compor
esse inconsútil jorro; Arrumá-lo num poema; e o
faz. E ao cabo Reluz com a sua obra. Que
aconteceu? Isto: O homem não se desvendou, nem foi
atingido: Na zona onde repousa em limos
Aquele rosto cuspido e aquele
Seco perfume de magnólias,
Fez-se um silêncio branco... E, aquele
Que não morou nunca em seus próprios abismos
Nem andou em promiscuidade com os seus fantasmas
Não foi marcado. Não será marcado. Nunca será
exposto Às fraquezas, ao desalento, ao amor, ao
poema."
Manoel de Barros
segunda-feira, 12 de março de 2012
a vida real

"Imperecível, de cristal, é a VIDA REAL"
António Franco Alexandre
António Franco Alexandre
"Se existisses, serias tu,
talvez um pouco menos exacta,
mas a mesma existência, o mesmo nome, a mesma morada.
Atrás de ti haveria
as mesmas duas palmeiras, e eu estaria
sentado ao teu lado como numa fotografia.
Entretanto dobrar-se-ia o mundo
(o teu mundo: o teu destino, a tua idade)
entre ser e possibilidade,
e eu permaneceria acordado
e em prosa, habitando-te como uma casa
ou uma memória."
Manuel António Pina
sexta-feira, 9 de março de 2012

"Sossega, coração! Não desesperes!
Talvez um dia, para além dos dias,
Encontres o que queres porque o queres.
Então, livre de falsas nostalgias,
Atingirás a perfeição de seres.
Mas pobre sonho o que só quer não tê-lo!
Pobre esperança a de existir somente!
Como quem passa a mão pelo cabelo
E em si mesmo se sente diferente,
Como faz mal ao sonho o concebê-lo!
Sossega, coração, contudo! Dorme!
O sossego não quer razão nem causa.
Quer só a noite plácida e enorme,
A grande, universal, solente pausa
Antes que tudo em tudo se transforme..."
Fernando Pessoa

"Saudade é solidão acompanhada,
é quando o amor ainda não foi embora,
mas o amado já...
Saudade é amar um passado
que ainda não passou,
é recusar um presente que
nos machuca, é não ver o futuro
que nos convida...
Saudade é sentir que existe
o que não existe mais...
Saudade é o inferno dos que perderam,
é a dor dos que ficaram para trás,
é o gosto de morte na boca dos que continuam...
Só uma pessoa no mundo deseja sentir saudade:
"aquela que nunca amou."
E esse é o maior dos sofrimentos:
não ter por quem sentir saudades,
passar pela vida e não viver.
O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido."
Pablo Neruda
terça-feira, 6 de março de 2012
A gente finge...

"A gente finge que arruma o guarda-roupa, arruma o
quarto, arruma a bagunça. Tira aquele tanto de
coisa que não serve, porque ocupar espaço com
coisas velhas não dá. As coisas novas querem
entrar, tanta coisa bonita nas lojas por aí. Mas a
gente nunca tira tudo. Sempre as esconde aqui,
esconde ali, finge para si mesmo que ainda serve. A
gente sabe. Que tá curta, pequeno, apertado. É que
a gente queria tanto. Tanto. Acredito que arrumar a
bagunça da vida é como arrumar a bagunça do quarto.
Tirar tudo, rever roupas e sapatos, experimentar e
ver o que ainda serve, jogar fora algumas coisas,
outras separar para doação. Isso pode servir melhor
para outra pessoa. Hora de deixar ir. Alguém
precisa mais do que você. Se livrar. Deixar pra
trás. Algumas coisas não servem mais. Você sabe.
Chega. Porque guardar roupa velha dentro da gaveta
é como ocupar o coração com alguém que não lhe
serve. Perca de espaço, tempo, paciência e
sentimento. Tem tanta gente interessante por aí
querendo entrar.
Deixa. Deixa entrar:
na vida, no coração, na cabeça.”
Caio Fernando Abreu
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